RALIBER- Orlanda Mendonça e Olga Boavida chegaram a Maputo vindas de Timor-Leste, trazendo consigo histórias, músicas e gestos que atravessam gerações. Orlanda, cantora e declamadora de 18 anos, partiu da sua ilha mãe com a sensação de entrar num mundo distante, mas imediatamente próximo. Olga, contadora de histórias e fundadora do colectivo Haktuir Ai-Knanoik, trouxe a tradição oral timorense, convertendo narrativas ancestrais em actos de criação coletiva. Durante três semanas, estas artistas mergulharam numa residência que transformou a forma como entendem resistência e afirmação cultural.
O projecto Resistir Para Existir, organizado pela Associação Cultural Scala em parceria com Khuzula Investments e apoiado pelo PROCULTURA, financiado pela União Europeia e cofinanciado pelo Camões, I.P., reuniu artistas emergentes de Timor-Leste, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São Tomé e Príncipe. O objetivo: recriar manifestações artísticas ligadas às lutas de libertação colonial e às resistências antifascistas, cruzando memórias e ritmos de diferentes territórios lusófonos.
Orlanda e Olga participaram de oficinas intensas de música, dança e teatro. A dança timorense Furak e a narrativa oral integraram-se nos ensaios coletivos, dialogando com ritmos tradicionais de Cabo Verde, as coreografias do tchiloli de São Tomé e Príncipe e movimentos da makwela guineense. Cada sessão tornou-se um laboratório vivo, onde melodias, gestos e palavras eram constantemente reconfigurados.

Nos ensaios, Orlanda descobriu nuances de técnicas de voz e improvisação, enquanto Olga transformava antigos contos em performances vivas. A convivência com colegas internacionais permitiu comparar estilos, ampliar repertórios e compreender que, apesar das diferenças culturais, os códigos de resistência são universais. “A língua comum ajudou-nos a escutar, perceber e reinventar juntos,” afirmou uma das participantes timorenses, destacando a importância do diálogo artístico.
O espectáculo final, apresentado no Centro Cultural Moçambique-China, traduziu estas semanas de criação em narrativa performativa. Poemas de Agostinho Neto, José Craveirinha e Jorge Rebelo abriram caminho para interpretações musicais de Zeca Afonso, Cesária Évora e Rui Mingas. As artistas timorenses brilharam em segmentos de canto e dança, reforçando a presença cultural do país. Olga conduziu segmentos narrativos inspirados na tradição oral timorense, enquanto Orlanda trouxe a intensidade da sua voz em canções coletivas, integrando-se com outros ritmos e coreografias do roteiro do espectáculo.

A residência consolidou-se como experiência transformadora. Ensaios, debates e trocas culturais intensas deram forma a uma criação coletiva que combina memória histórica, expressão contemporânea e afirmação da identidade cultural. O regresso a Timor-Leste significa levar de volta repertórios, técnicas e experiências que se entrelaçam com o quotidiano artístico local, reforçando o papel da arte como instrumento de resistência e de construção de futuro.
Kontribui husi Assosiasaun Haktuir Ai-Knanoik.
















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